Psicanalistas aprovam a brincadeira, mas machismo fortalece o preconceito; brincar com boneca pode colaborar na formação do futuro pai
Marcelo Bulgarelli
Equipe O DIÁRIO
Você daria uma boneca para o seu filho? Ou você daria um carrinho para sua filha brincar? O debate sobre o papel social dos sexos no processo de educação das crianças cresceu em Maringá após a publicação do livro “O Menino que Ganhou uma Boneca” de Majô Bap-tistoni, lançado em março. A autora, membro do grupo Vez e Voz da Mulher, não imaginava tanta polêmica ao contar a simples história de um menino que brincava de ser pai.
O psicanalista Raymundo de Lima, doutorando em Educação pela USP, se surpreendeu com o conteúdo do livro, pois a obra abre um bom debate sobre a dimensão psicológica, ética, moral e cultural da sociedade. “Quem criticaria o machismo anos atrás? O livro não visa apenas embalar, mas abalar os nossos preconceitos”. A publicação mostra, então, um avanço nessas discussões.
Lima também debateu o conteúdo do livro com o filho Igor, 9 anos. A criança já foi vítima de preconceito – acredite se quiser – pelo fato de estudar piano clássico. Arredio no início, Igor leu o livro de Majô e gostou. “O livro é destinado às crianças, mas deve ser lido principalmente pelos professores”, acrescentou o psicanalista.
DIVERGÊNCIAS
Boa parte dos homens se chocou com o conteúdo da publicação. Até uma orientadora educacional disse preferir ter um filho machista ao invés de presenteá-lo com uma boneca. Baptistoni também ouviu muitas piadas de colegas. Um amigo chegou a dizer que o filho dele somente brincaria com boneca se essa fosse “inflável”.
A autora ressalta, contudo, a importância de eliminar o complexo de culpa de meninos que brincam ou já brincaram de boneca. Como poucos pais compram esse tipo de brinquedo para os filhos, essas crianças acabam brincando com as bonecas da irmã ou de uma coleguinha. Porém, os meninos deixam a brincadeira de lado quando começam os apelidos de “maricas” ou “boiola”.
O LIVRO
Mas o conteúdo da publicação é tão polêmico assim? “O Menino que Ganhou uma Boneca” conta a história de Paulinho, um menino de 4 anos que ganhou o inusitado presente. Ele e a família desconhecem quem foi o autor do agrado. Chegam a imaginar a possibilidade de ter havido alguma troca de embrulhos na loja.
Mas Paulinho acaba gostando da boneca, apesar dos preconceitos dos coleguinhas. Mais tarde, a tia tem um bebê e ele descobre que o tio sequer sabia segurar a criança.
Paulinho passa também aceitar as meninas brincando de carrinhos. Afinal, assim como as mães, elas também serão motoristas quando crescerem. “O final não precisa ter uma moral da história, mas uma proposta de reflexão, de ato”, comenta Lima. E acrescenta: “a liberdade do ser humano é a opção de escolhas. O maior perigo, contudo, é alguém escolher por ele”.
SEM CULPA
A psicóloga Marta Dalla Torre Fregonezi, psicanalista em formação na Biblioteca freudiana de Curitiba, também observa: “Visto pelo viés da psicanálise, todo sujeitinho quando vem ao mundo, vem para ocupar um lugar idealizado por estes que o aguardam, pais e familiares. É, portanto, na expectativa desse adulto que ele se constrói como menino ou menina. Lugares que sempre foram bem definidos entre o rosa e o azul e pelos papéis sociais como ‘isso é coisa de menina, coisa de mulher, ou homem não chora’”.
Historicamente, a psicóloga analisa as mudanças ocorridas após a 2ª Grande Guerra, o advento da pílula anticoncepcional e outras revoluções compor-tamentais. Esses momentos derrubaram a ingênua crença de que a diferença sexual se faz apenas por referência externas.
“As brincadeiras só correm risco de se transformarem em ‘verdade’ se o olhar que o adulto lhe dirige estiver marcado por preconceitos e medo, antecipando o que não é. Dar lugar, antes de qualquer coisa, à criança para ser criança, é possivelmente garantir ao menino vir a ser homem e a menina vir a ser mulher, nesta diferença radical de sexo. Diferença necessária pois constrói a família, mas que não impede de serem parceiros ao invés de estarem no eterno embate masculino/feminino, homem/mulher”, arrebatou Fregonezi.
A boneca como material pedagógico
Menino pode brincar de boneca. O Colégio Paraná, em Maringá, esta há um ano acabando com o preconceito. As crianças da faixa etária de três a seis anos da Educação Infantil “adotaram” uma boneca batizada de “Sandy”. Cada aluno deve passar um dia com a “colega” em casa, sem esquecer da alimentação, da hora de dormir e dos demais afazeres para com o “bebê”.
A intenção inicial dos educadores era ensinar as crianças a conservação dos brinquedos. “Sandy”, então, surgiu como a personagem ideal, desenvolvendo a responsabilidade por parte dos alunos. Meninos e meninas aceitaram naturalmente a nova “coleguinha”, sempre vestida com o uniforme do colégio.
Mas nem todos os pais deixaram os filhos brincarem com a boneca. “Ainda há muito preconceito, mas nossa intenção é incentivar a responsabilidade, a fantasia e a criatividade”, esclarece a coordenadora pedagógica Rosa Scharf Minetto.
A brincadeira também ganhou uma certa rejeição entre os meninos mais velhos. Influenciados pelos irmãos e vizinhos, eles já temem as implicâncias e preconceitos. Por outro lado, segundo os educadores, o mais importante é a abertura do debate, indicando uma nova postura no futuro do papel social dos homens e mulheres.
Além do livro de Bap-tistoni, também é possível encontrar nas livrarias a obra do sexólogo Marcos Ribeiro, “Menino Brinca de Boneca?” (Editora Salamandra). O prefácio é assinado por Marta Suplicy . Segundo o autor, o menino brinca e deve brincar de tudo que lhe dê prazer. A intenção é mostrar que ele não se tornará homossexual no futuro somente porque brincou de boneca. Marcelo Bulgarelli
3 comentários:
Essa é uma questão polêmica, diríamos que uma pesquena parcela da sociedade (limita-se a estudiosos com certeza) pactuam desse ponto de vista.Faço um questionamento: Considerando os diversos tipos de personalidades, em especial os -tipos- influenciáveis, motivá-los a fazer uso de brinquedos que foram idealizados exclusivamente para meninos ou para meninas, não seria uma forma irresponsável de decidir um estilo de vida, para um ser que não possui maturidade para julgar o que é certo ou errado, numa sociedade que ele ainda desconhece? Por outro lado também não iria gerar um conflito entre a orientação familiar e a que está sendo imposta pela escola? Sim, porque o bebê houve desde o ventre, a voz do pai, dizendo-lhe - olá, aqui quem fala é o papai ou a mamãe - essa distinção entre pai (homem) e mãe (mulher) = FAMÍLIA, é genético, e a influencia de um adulto pode alterar isso de forma negativa. Devemos deixar alguns ensinamentos para os momentos oportunos, de acordo com o nível de amadurecimento do ser humano. Bons exemplos vem da palavra do criador que é DEUS.
Não entendi...não somos todos iguais perante Deus??
Não é uma simples boneca para um garoto ou um caminhão para uma menina,que os transformarão em pessoas com menos qualidades.
Acho muito válido esse tipo de experiência nas escolas.As nossas crianças precisam aprender ,acima de tudo,a respeitar atudo e a todos.
Homens e mulheres são diferentes!
É pura tolice tentar tratar igual seres tão diferentes!
É lamentável um psicanalista não ver o óbvio!
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